Eduardo Barbosa ▪ 01 nov 2023
O protagonista de Passagens é um diretor de cinema em seu auge profissional. Tomas, interpretado por Franz Rogowski, é exigente com seus atores. Dirige com mão de ferro seu último filme. É agressivo com sua equipe no set de filmagens. Ele consegue emplacar a obra em um festival renomado. Tem uma carreira de sucesso.
Mas se tudo corre bem na vida profissional o mesmo não se dá em sua vida pessoal. Tomas está em um relacionamento com Martin, interpretado por Ben Wishaw. Apesar de o companheiro ser compreensivo e relevar seu comportamento agressivo com as pessoas que os cercam alguma coisa na relação não vai bem. As coisas pioram quando Tomas conhece uma professora em uma festa e inicia um romance com ela. Agathe (Adèle Exarchopoulos), a professora, aos poucos ocupa um espaço aberto entre os dois parceiros. Tomas acaba se mudando para sua casa e tenta se equilibrar na corda bamba de um relacionamento a três mal calibrado.
Enquanto isso, Martin se afasta aos poucos. Conhece um escritor de romances por quem se interessa afetivamente. Mas não consegue se desvencilhar completamente do antigo companheiro. Todas as tentativas de afastamento o levam de volta a Tomas.
Agathe fica grávida. Surge um conflito entre seus pais e Tomas. A sexualidade e o comportamento do diretor os desagradam. Os pais interferem no relacionamento, complicando um pouco mais a tentativa de Tomas de inserir a companheira entre ele e Martin. Por fim, a professora desiste de bancar a relação a três e resta a Tomas voltar ao relacionamento com Martin. Mas as escolhas feitas no encontro com Agathe resultam em fendas mais profundas que impedem uma retomada com Martin.
Pensar apenas em si mesmo quando se tem uma vida a dois é o pecado de Tomas. Ele cruza os limites. Ignora os desejos do companheiro. A conta do seu hedonismo chega e Tomas precisa pagá-la. A ideia do filme é discutir uma relação não-monogâmica e o faz a partir de uma visão negativa. A entrada de Agathe na vida dos dois produz um desmoronamento crescente até deixar tudo em escombros. A mensagem é clara acerca dos perigos de um relacionamento não-convencional envolvendo mais de duas pessoas. Tudo pode terminar em um punhado de moscas na mão. Fica parecendo, nesta história de poliandria, que a terceira pessoa é mera fonte de prazer.
A interpretação de Franz Rogowski tem a mesma qualidade vista em Great Freadom (2022), impecável. Ele consegue dar vida a esse homem dividido entre o amor-próprio em excesso e o amor pelo companheiro de forma irretocável, convencendo o espectador desse desajuste a cada cena. A química entre ele e Ben Wishaw é inquestionável, o que dá vigor aos conflitos e enriquece o drama. Mas se este é um elemento a sobrar entre eles, não se pode dizer o mesmo entre Rogowski e Adèle Exarchopoulos. A paixão do casal na tela se dá a duras penas e só se sustenta nas cenas de sexo, faltam os olhares, as intimidades, aquilo que deixa o casal de homens tão convincente na tela. Outro ponto questionável são as cenas de sexo filmadas exaustivamente. Elas tem por objetivo mostrar a atração entre as parcerias amorosas. No entanto, cansam pelo excesso do uso.
Mas, de modo geral é um bom drama sobre relacionamentos amorosos não-hegemônicos. Só não espere por finais adocicados salpicando o destino dos personagens. Ira Sachs soa mais pessimista do que nunca com Passagens.
Passagens
Título original: Passages
Ano: 2023
Duração: 1h 32min.
Direção: Ira Sachs
Roteiro: Ira Sachs e Mauricio Zacharias
Elenco principal: Franz Rogowski, Ben Wishaw e Adèle Exarchopoulos
Origem: França