09/11/2024

O Quarto ao Lado: um drama impactante de Pedro Almodóvar, com tema delicado e estética refinada

Este é o primeiro longa-metragem em língua inglesa realizado por Pedro Almodóvar. O elenco principal conta com duas veteranas do cinema hollywoodiano, Julianne Moore e Tilda Swinton. A construção de suas personagens faz ruir definições rígidas de protagonista e coadjuvante neste drama sobre a reivindicação do manejo da própria morte. É uma história sobre morte assistida e sobre as consequências legais desse ato para auxiliares.

A trama conta o reencontro de Ingrid (Julianne Moore), uma escritora de sucesso, com sua amiga Martha (Tilda Swinton), uma jornalista correspondente de guerra. Uma escreve livros sobre os benefícios da longevidade humana; a outra narra relatos de destruição e morte. Uma recorre à criação fictícia para atingir o efeito ideal em seus textos; a outra se atêm aos fatos. Elas têm formas opostas de encarar e retratar o mundo a sua volta. Tal desenho de personagens é suficiente para garantir a solidez da base do conflito a se desenvolver entre as duas.

Martha está com um câncer terminal. Ingrid começa a visitá-la frequentemente. A doença as reaproxima. Quando nenhum tratamento lhe oferece chances mínimas de sobreviver, a jornalista decide fazer o manejo da própria morte. Isto é, resolve tomar uma pílula para conduzir um processo rápido de finalização da sua vida ao invés de deixar a doença o fazê-lo a conta gotas.

Ela está decidida. Mas precisa de auxílio. Necessita de uma companhia para ficar em um quarto ao lado do seu quando a derradeira hora chegar. Essa presença lhe garantiria maior segurança para tomar a pílula. Caso as coisas fujam do esperado, haverá ajuda. No entanto, ninguém de seu círculo de amigas aceitam o convite. Então, só resta a Martha recorrer àquela a acompanhar seu sofrimento durante os últimos meses, Ingrid.

A escritora entra em um dilema. Ela é uma entusiasta pública do prolongamento da vida. Como poderia ser conivente e auxiliar um processo de morte assistida? Por outro lado, seria justo prolongar uma vida em um corpo corroído por uma doença sobre a qual não há qualquer chance de controle? Ingrid precisa escolher um caminho. Agirá conforme suas convicções e beneficiará a lenta degradação do corpo de sua amiga? Ou renuncia a seus ideais e lhe ajuda na interrupção definitiva do sofrimento de Martha?

O filme aposta na complexidade emocional das personagens e as aproxima do espectador com uma profusão de enquadramentos de rostos e diálogos expositivos. Essas técnicas criam um ambiente no qual é possível sentir empatia por Martha e Ingrid.

Almodóvar embala visualmente essa história com sua paleta tradicional de cores vivas. Mas dessa vez o colorido dramático emerge com a máxima opulência no figurino e em pontos específicos da direção de arte. Martha e Ingrid vestem-se com peças a alternar tons abertos e fechados. Os vermelhos, verdes e azuis, abarrotam um guarda-roupas multicolorido a compor-se de vibração e sobriedade. Vez em quando há um amarelo solar pontuando a esperança de conforto na morte. Os sofás se poltronas, espreguiçadeiras, vasos, balcão de cozinha, luminárias, flores, e uma porta específica do cenário, seguem a mesma paleta de cores.

A mise-en-scène, dispondo as atrizes nesses cenários pontuados por objetos dos quais os olhos não são capazes de se desviar, parece ter como referência as obras de Edward Hooper. Há muitas cenas a lembrar alguns dos quadros do artista norte-americano. Como Automat (1927), Chop Suey (1929), Room in Brooklin (1932), Hotel Room (1939), e Morning sun(1952). Uma fonte estética adequada para uma história ambientada em uma cidade dos Estados Unidos. 

Embora estejam cercadas pela alegria dos objetos cênicos coloridos, solidão e desamparo transbordam das figuras femininas nas telas de Hooper. A jornalista de Almodóvar é uma dessas mulheres, mas em quadros em movimento. O resultado é um filme esteticamente vistoso, bonito na tela. A cena de Martha em uma espreguiçadeira verde, vestida com um casaco amarelo, com um batom vermelho nos lábios, não poderia ser mais hooperiana e, ao mesmo tempo, tipicamente almodovariana.


Eduardo Barbosa ▪ 10 nov 2024

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O QUARTO AO LADO

Título original: The room next door
Ano: 2024
Duração: 1h 47min.
Direção: Pedro Almodóvar
Roteiro: Pedro Almodóvar
Elenco principal: Julianne Moore, Tilda Swinton e John Turturro
Origem: Espanha

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